Tudo que Imaginamos como Luz: geografia urbana é espaço de debate das ilusões e dos sonhos das mulheridades indianas em comovente longa de Payal Kapadia
Título original: All We Imagine as Light
Países de origem: França, Índia, Holanda e Luxemburgo (2024)
Duração: 115 minutos
Gênero: drama
Direção e roteiro: Payal Kapadia
Produção: Thomas Hakim e Julien Graff
Fotografia: Ranabir Das
Montagem: Clément Pinteaux
Direção de arte: Piyusha Chalke, Yashasvi Sabharwal e Shamim Khan
Som: Benjamin Silvestre, Romain Ozanne, Olivier Voisin
Música: Dhritiman Das
Elenco: Kani Kusruti, Divya Prabha, Chhaya Kadam, Hridhu Haroon, Azees Nedumangad
Esmagadora da dignidade e dos sonhos das classes trabalhadoras, a Mumbai de Tudo que Imaginamos como Luz (título original: All We Imagine as Light, 2024) azula-se ao amanhecer. Associada ao cuidado (genderizado) e à queda à rotina laboral, a cor anoitece os dias de Prabha (Kani Kusruti) à desilusão infundidamente amorosa de um casamento cuja distância geográfica revela-se sobretudo emocional. Ante a taciturnidade da personagem de Kani Kusruti, Anu (Divya Prabha) opõe-lhe a juventude e o desejo enquanto ativos da jornada de amadurecimento pró-emancipação materna, dado o apelo sancionável do romance vivido com Shiaz (Hridhu Haroon), pessoa muçulmana, ao que Parvaty (Chhaya Kadam) confronta-a com a expectativa do desamparo à solidão, pois sem a presença masculina. Interpostas, as três gerações de mulheres constituem-se elemento retórico do debate da diretora-roteirista Payal Kapadia acerca do estado de coisas sociopolítico indiano para as mulheridades no atual estágio de inserção do país na ordem econômica do capitalismo financeiro multipolar.
Fragmentários, os enquadramentos reforçam o imobilismo de uma vida aferrada ao passado da submissa relação da protagonista com o marido, pois antes determinista de gênero. Símbolo do idealizado futuro de equidade, a câmera repousada sobre Divya Prabha realiza-se dinâmica no influxo do amor experienciado junto ao par escolhido, porquanto fruto de exercício autonômico. Já na vaga do retorno da companheira mais velha à aldeia originária, a suspensão tempo-visual processada em tela estabelece-se reconciliadora da identidade da enfermeira-chefe com o presente e com o aprendizado da fantasia do querer em plano a efetivar-se de longa duração. Se as amareladas luzes da noite urbana fazem-se abrigo não formal de dignitários pedidos de paz interior, o colorido saturado da iluminação à beira-mar será espaço do reencontro com as diferenças e com a humanidade do próprio lugar no mundo.