Tudo que Imaginamos como Luz: geografia urbana é espaço de debate das ilusões e dos sonhos das mulheridades indianas em comovente longa de Payal Kapadia

Thainá Campos Seriz
3 min readOct 30, 2024

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Pôster promocional de “Tudo que Imaginamos como Luz” (título original: “All We Imagine as Light”, 2024), longa dirigido e roteirizado por Payal Kapadia vencedor do Grande Prêmio do Júri do Festival de Cannes 2024. Foto: reprodução.

Título original: All We Imagine as Light
Países de origem: França, Índia, Holanda e Luxemburgo (2024)
Duração: 115 minutos
Gênero: drama
Direção e roteiro: Payal Kapadia
Produção: Thomas Hakim e Julien Graff
Fotografia: Ranabir Das
Montagem: Clément Pinteaux
Direção de arte: Piyusha Chalke, Yashasvi Sabharwal e Shamim Khan
Som: Benjamin Silvestre, Romain Ozanne, Olivier Voisin
Música: Dhritiman Das
Elenco: Kani Kusruti, Divya Prabha, Chhaya Kadam, Hridhu Haroon, Azees Nedumangad

Esmagadora da dignidade e dos sonhos das classes trabalhadoras, a Mumbai de Tudo que Imaginamos como Luz (título original: All We Imagine as Light, 2024) azula-se ao amanhecer. Associada ao cuidado (genderizado) e à queda à rotina laboral, a cor anoitece os dias de Prabha (Kani Kusruti) à desilusão infundidamente amorosa de um casamento cuja distância geográfica revela-se sobretudo emocional. Ante a taciturnidade da personagem de Kani Kusruti, Anu (Divya Prabha) opõe-lhe a juventude e o desejo enquanto ativos da jornada de amadurecimento pró-emancipação materna, dado o apelo sancionável do romance vivido com Shiaz (Hridhu Haroon), pessoa muçulmana, ao que Parvaty (Chhaya Kadam) confronta-a com a expectativa do desamparo à solidão, pois sem a presença masculina. Interpostas, as três gerações de mulheres constituem-se elemento retórico do debate da diretora-roteirista Payal Kapadia acerca do estado de coisas sociopolítico indiano para as mulheridades no atual estágio de inserção do país na ordem econômica do capitalismo financeiro multipolar.

Prabha (Kani Kusruti, à esquerda), Anu (Divya Prabha, à direita) e Parvaty (Chhaya Kadam) metonizam avanços, retrocessos, continuidades e permanências do estado de coisas sociopolítico das mulheridades indianas em debate poético-visual estabelecido por Payal Kapadia neste Tudo que Imaginamos como Luz (título original: All We Imagine As Light, 2024). Fotos: reprodução.

Fragmentários, os enquadramentos reforçam o imobilismo de uma vida aferrada ao passado da submissa relação da protagonista com o marido, pois antes determinista de gênero. Símbolo do idealizado futuro de equidade, a câmera repousada sobre Divya Prabha realiza-se dinâmica no influxo do amor experienciado junto ao par escolhido, porquanto fruto de exercício autonômico. Já na vaga do retorno da companheira mais velha à aldeia originária, a suspensão tempo-visual processada em tela estabelece-se reconciliadora da identidade da enfermeira-chefe com o presente e com o aprendizado da fantasia do querer em plano a efetivar-se de longa duração. Se as amareladas luzes da noite urbana fazem-se abrigo não formal de dignitários pedidos de paz interior, o colorido saturado da iluminação à beira-mar será espaço do reencontro com as diferenças e com a humanidade do próprio lugar no mundo.

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Thainá Campos Seriz
Thainá Campos Seriz

Written by Thainá Campos Seriz

Historiadora (UFF). Pesquisa e revisão de conteúdo no Canal Preto. Escrevo sobre cinema.

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