Psicopata Americano: sátira anti-WASP de Mary Harron critica irrelevância plutocrata do branco masculinismo neoliberal estadunidense

Thainá Campos Seriz
3 min readMay 28, 2024
Pôster promocional de “Psicopata Americano” (título original: “American Psycho”, 2000), longa dirigido por Mary Harron e roteirizado por Guinevere Turner e por Mary Harron em adaptação ao romance homônimo (1991) de autoria do escritor estadunidense Bret Easton Ellis (1964). Foto: reprodução.

Título original: American Psycho
Países de origem: Canadá e Estados Unidos (2000)
Duração: 101 minutos
Gênero: sátira; horror psicológico
Direção: Mary Harron
Roteiro: Guinevere Turner e Mary Harron
História original: Bret Easton Ellis (1991)
Produção: Edward R. Pressman, Chris Hanley e Christian Halsey Solomon
Fotografia: Andrzej Sekuła
Montagem: Andrew Marcus
Trilha sonora: John Cale
Direção de arte: Andrew Stearn
Figurino: Isis Mussenden
Distribuição: Lionsgate
Elenco: Christian Bale, Willem Dafoe, Chloë Sevigny, Reese Witherspoon, Jared Leto, Josh Lucas, Samantha Mathis, Matt Ross, Justin Theroux

A leitura contemporânea da adaptação para a telona do romance homônimo (1991) de autoria de Bret Easton Ellis (1964) por Mary Harron faz de Psicopata Americano (título original: American Psycho) (Lionsgate, 2000) libelo anti-WASP poderoso. Christian Bale é Patrick Bateman, um herdeiro yuppie de Wall Street cuja extravagância autocongratulatória torna-o presa fácil às iguais ostentações alheias. À jovialidade conquistada entre zelosos cuidados com o corpo magro e com a pele alva, o frágil equilíbrio das aparências vê-se conquanto ruído à expressão gradativamente violenta de uma interioridade sublimada à performance social do habitus (Bourdieu, 2003) plutocrata de origem.

A máscara social de Patrick Bateman (Christian Bale) é antes ideológica, pois propagandista do modo de vida WASP do reaganismo yuppie estadunidense (década de 1980). Foto: reprodução.

Junto ao predomínio de ângulos baixos, os planos médios reforçam dualidades emuláveis à ficção psicológica do triunfo sempre liberal das vontades (Riefenstahl, 1935). Branco e masculino, o poder locupleta-se ao falso humanismo progressista e à supremacia contraminorias civilizada (Elias, 1939) do teatro do cotidiano, sendo as fantasias misógina e aporofóbica envidadas em noite alta pulsão neurótica (Freud, 1909–10) de uma dignidade outrora vilipendiada. Ante a vida de jantares nos bem-iluminados salões de uma elite parasitária revelada enfadonha, a descida ao Coração das Trevas (Conrad, 1899; 1902) de profissionais do sexo, de pessoas em situação de rua ou LGBT+ nova-iorquino satiriza o desejo mundano de Bateman por amenidades e por irrelevância no vazio mesmo de uma vida colonizada e no canto de lamento vitimista entoado à consecução de razia violadora já histórica.

Verborrágico, o inconsciente em luta do protagonista tenta fugir à realidade que, material, fundamenta as sanguinolentas aventuras juvenis realizadoras de uma humanidade negada. A julgar a confissão desesperada e impune dos crimes de ódio praticados em série, a indiferença de reaganianas sensibilidades à escória societária enfim sanitizada ainda medicalizará o comportamento fóbico. O tipo de inflexão homonacionalista (Preciado, 2017) vivido em 2024 reencontra em American Psycho algumas das imagens outra vez encenadas do horror, e a despeito das manifestações dos brancos identitarismos à direita e à esquerda, a crítica artístico-intelectual a jugo masculinista assim replicável goza, sim, de precedentes.

Despersonalizado à performance imperativa de seus gênero, raça/cor e classe entre o culto yuppie às aparências, Patrick Bateman (Christian Bale) oscila do humanismo liberal à pulsão supremacista antiminorias, quando o já frágil equilíbrio mental faz irromper uma sanha homicida não mais civilizável (Elias, 1939) ao habitus (Bourdieu, 2003) classista. Fotos: reprodução.

Visto no Clube do Crítico 26.

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Thainá Campos Seriz

Historiadora (UFF). Pesquisa e revisão de conteúdo no Canal Preto. Podcaster no ObSessões de Cinema.