Onde os Fracos Não Têm Vez: decadência e envelhecimento masculinos protagonizam fuga da ameaça à morte social em inesquecível western dos irmãos Coen

Thainá Campos Seriz
3 min readSep 25, 2024

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Pôster promocional de “Onde os Fracos Não Têm Vez” (título original: “No Country For Old Men”, 2007) (Paramount Classics, 2008), longa dirigido e roteirizado por Ethan e por Joel Coen em adaptação ao romance homônimo de autoria de Cormac McCarthy (2005). Foto: reprodução.

Título original: No Country For Old Men
País de origem: Estados Unidos (2007)
Duração: 122 minutos
Gênero: thriller; western; drama
Direção e roteiro: Ethan Coen e Joel Coen
História original: Cormac McCarthy (2005)
Produção: Scott Rudin, Ethan Coen e Joel Coen
Fotografia: Roger Deakins
Montagem: Roderick Jaynes (Ethan Coen e Joel Coen)
Direção de arte: Jess Gonchor
Trilha sonora: Carter Burwell
Figurino: Mary Zophres
Distribuição (Brasil): Paramount Classics
Elenco: Javier Bardem, Josh Brolin, Tommy Lee Jones, Kelly Macdonald, Woody Harrelson, Garret Dillahunt

A (árida) paisagem desértica é a quaternária personagem de Onde os Fracos Não Têm Vez (título original: No Country For Old Men, 2007) (Paramount Classics, 2008), pois síntese das cruas e assim pouco saturadas perspectivas acerca do presente e do futuro de um sulista Oeste (estadunidense e leste-asiático) em decadência. À semelhança do passado de morticínios e de triunfo da branca valentia juvenil sobre o próprio destino, a câmera estática e a longa duração dos planos emulam em tons terrosos o imobilismo do mundo a conhecidas dificuldades econômicas e à sobrevivência à escassez, porquanto reservadas as hierarquias societário-estamentais setentistas. Cenário distinto ao da pauperização continuada parece afigurar-se, quando Llewelyn Moss (Josh Brolin) apossa-se da rica maleta de dinheiro deixada na cena de um tiroteio ocorrido no terreno de sua caçada habitual e, por fazê-lo, tornar-se-ia ele a presa de um caçador sobremaneira implacável.

Llewelyn Moss (Josh Brolin) é um soldador aposentado que, em sua caçada habitual, depara-se com a possibilidade de enriquecimento oferecida por uma maleta de dinheiro. Apossar-se dela, no entanto, fá-lo-ia presa de outro caçador implacável. Fotos: reprodução.

Irado com o sequestro do espólio de uma transação a denominar-se comercial (contém ironia), o psicopático Anton Chigurh (Javier Bardem) desestabiliza os poderes locais texanos na perseguição ao insólito adversário e a julgados eventuais colaboradores do soldador aposentado em fuga com os US$ 2 milhões do negócio de heroína. Atmosférica, a tensão de cada próximo passo do assassino profissional estabelece-se entre motivos visuais construídos em ângulos médio-baixos e em focos os quais, sob detalhe, revelam o andar pari passu à fálica arma de compressão utilizada nos homicídios. Já em paralelo à trajetória do duo e em vias de aposentar-se, o xerife Ed Tom Bell (Tommy Lee Jones) atravessa o dilema da solidão e da irrelevância do legado familiar à passagem geracional da estrela carregada no peito ao jovem Wendell (Garret Dillahunt) enquanto as notícias do imbróglio surgido começam a preocupá-lo e mantêm-no atrelado ao trabalho. A julgar o belíssimo trabalho com as sombras, com as duplas exposições e com a narração em voice-over, a sugestão da memória como nevrálgica às motivações da personagem implica-a vínculo a compreender-se emocional com a iminente ameaça da morte social ao envelhecimento bergmanianamente (1957) metonimizada pelo antagonista de Bardem.

Se a ganância é estressora indubitável das ações de Moss, o desejo da aventura final ao ostracismo e ao amor submisso, porém não companheiro de Carla Jean (Kelly Macdonald) torna-o polo do interesse de outrem por irrelevante existência e, de forma derradeira, faz das consequências algo por que vale a pena viver. Quanto a Bell, sentir-se agente necessário à mediação, ou à consecução, da paz e das sociabilidades do condado preserva-o protagonista da história reivindicada identidade frente ao esquecimento. Resgate ou não da aposta feita na vida, o esforço de ambos reflete a escolha não segura de prevalecer ao fim e, para não morrer vivos, perder seria ganho do arroubo de sobreviver.

Psicopático, Anton Chigurh (Javier Bardem) é o caçador que, implacável, não medirá esforços para retomar o que é seu. Inescrupuloso, o assassino profissional é ele mesmo o símbolo de imposição da decadência a homens infantilizados pelo envelhecimento e pelo próprio destino. Fotos: reprodução.

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Thainá Campos Seriz
Thainá Campos Seriz

Written by Thainá Campos Seriz

Historiadora (UFF). Pesquisa e revisão de conteúdo no Canal Preto. Escrevo sobre cinema.

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