Na Ponta dos Dedos: digno ao amor é também reconhecê-lo finito
Título original: Fingernails
País de origem: Estados Unidos
Duração: 113 minutos
Gênero: drama; romance; ficção científica
Direção: Christos Nikou
Roteiro: Stavros Raptis, Sam Steiner e Christos Nikou
Produção executiva: Glen Basner, Alison Cohen, Jerome Duboz, Ashley Fox, Kevin Lafferty e Milan Popelka
Produção: Cate Blanchett, Coco Francini, Christos Nikou, Andrew Upton e Lucas Wiesendanger
Produção associada: Christopher Rivera
Direção de fotografia: Marcell Rév
Edição: Yorgos Zafeiris
Trilha sonora: Christopher Stracey
Direção de arte: Mathew Birtch
Elenco: Jessie Buckley, Riz Ahmed, Jeremy Allen White, Annie Murphy, Luke Wilson
Um teste genético indica a compatibilidade total, parcial ou nula de pessoas pretendentes a um relacionamento romântico. Há quem rejeite ir além e à esquerda nesta compreensão, mas um regime econômico também superestrutura modelos relacionais e, no atual estágio do capitalismo financeiro neoliberal, a partir da indicação sintomática de linhas acima, disponibilizar-se à construção do crescimento espiritual de outrem (bell hooks, 2000) e permitir-se a vulnerabilidade entre o acolhimento a quem se é pela pessoa parceira, agora, concertam-se revolucionários. Sob premissa talvez diversa, Na Ponta dos Dedos (título original: Fingernails, 2023) coloca em xeque, porém, a fantasia sacrificial das individualidades por certo romantismo pasteurizador das diferenças, aliás, um produto histórico.
No longa dirigido por Christos Nikou e com roteiro de Stavros Raptis, de Sam Steiner e de Christos Nikou, a fabulosa Jessie Buckley é Anna, uma jovem professora primária que considera viver uma crise no relacionamento com Ryan (Jeremy Allen White), dada a distância em algum momento estabelecida e a perda de conexão entre ambos. Sendo, de acordo com a tal testagem feita outrora, 100% compatíveis, a protagonista de Buckley quer investigar a razão da fissura aberta a uma assimetria percebida e, claro, equalizá-la. Com este fim, a mestra candidata-se a uma vaga no recém-criado Instituto do Amor e, uma vez admitida como instrutora, aprenderá em treinamento técnicas para recriar e/ou para fortalecer laços com o amado. No entanto, o gradual apaixonamento por Amir (Riz Ahmed) poderá colocar tudo a perder.
O enquadramento em primeiríssimos planos das personagens centrais parece querer-nos aproximar em afinidade e em empatia às angústias inseridas por Anna em tela, enquanto o uso de alguns diótropos variáveis aponta a cisão exatamente forjada entre casais hétero ou homoafetivos à falta por vezes construída de reciprocidade — causa provável do fim amor — . Se a ansiedade da escolha no mercado afetivo é quase uma imposição para mulheres e até para masculinidades dissidentes, a evitação do sofrimento por um não término, ou, ao contrário, pelo reinício de um teatro social folhetinesco desgastante é saída psico-socioemocional infantilizadora afeita, pois criatura, ao individualismo capitalista. Não permanecemos as mesmas e os mesmos ao início ou ao fim de relações, e abraçar mudanças é ação de dignidade.
Cíclica, a vida encerra-se e reinicia-se à coragem de sua transformação, e o amor também é parte transformada. Mais respeitoso seria enxergá-lo e acolhê-lo na história a dois e/ou a mais envolvidas e envolvidos criada neste tempo. Recomeçar é digno. Na Ponta dos Dedos torna recomeços em imagem com beleza sem igual e merece, quando possível, ser visto.
Assistido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo 2023, Fingernails ainda não tem previsão de estreia no Brasil.
