Moneyboys: ambiguidade da jornada em direção à humanidade é também reflexo da dualidade de assimetrias do próprio país de origem

Thainá Campos Seriz
3 min readFeb 8, 2024

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Pôster promocional de “Moneyboys” (título em chinês tradicional: 金錢男孩, 2021), longa com direção e autoria no roteiro do estreante de C.B. Yi. Foto: reprodução.

Título: Moneyboys
Países de origem: Áustria, França, Bélgica e Taiwan (2021)
Duração: 120 minutos
Gênero: drama
Direção e roteiro: C.B. Yi
Produção: Gabriele Kranzelbinder, André Logie, Barbara Pichler e Guillaume de la Boulaye
Direção de fotografia: Jean-Louis Vialard
Montagem: Dieter Pichler
Trilha sonora: Yun Xie-Loussignan
Distribuição (Brasil): Pandora Filmes
Elenco: Kai Ko, Chloe Maayan, Yufan Bai, J.C. Lin, Qiheng Sun, Yan-Ze Lu, Daphne Low, Mu Chen, Teng-Hui Huang, I-Hsiung Lin

A despeito de cores locais, partilha comum ao globo é o descompasso geracional verificável à promessa de milagres econômicos e à realidade material de concretude em tempo diverso do aventado. Dada a falácia a termo do sonho de prosperidade, na esfera privada, o confronto com um país revela ainda camadas outras da crueldade multifacetada de violências dirigidas às subjetividades. Em Moneyboys (título em chinês tradicional: 金錢男孩, 2021) (Pandora Filmes, 2024), Liang Fei (Kai Ko) retira do trabalho enquanto profissional do sexo parte da renda que garante a reprodução econômico-financeira do núcleo familiar formado por irmã, sobrinhos, pai e avô no interior rural chinês. Já rejeitado em face do estigma recaído sobre o labor, a homossexualidade do protagonista é força concorrente às expectativas sociais de gênero antes rompidas ao recurso à prostituição como fonte de vencimentos. Uma vez migrante e ao cansaço da solidão urbana, um taciturno Fei tenta encontrar novo sopro de vida no amor por Long (Yufan Bai), embora o reencontro com Xiaolai (J.C. Lin) vá assombrá-lo no passado então reprimido à memória.

Na imagem à esquerda, Liang Fei (Kai Ko) (esquerda) fita com severidade o a posteriori feito companheiro Long (Yufan Bai) (direita). Na imagem à direita, Fei é encarado por Xiaolai (J.C. Lin), amor da juventude. Fotos: reprodução.

A direção e o roteiro estreantes de C.B. Yi localizam à preponderante paleta de cores em azul e à posição em geral encerrada da personagem de Kai Ko nos polos inferiores de cada quadro certa melancolia pela dupla perfomance socioemocional requerida à impassibilidade do exercício daquela profissão entre riscos conhecidos ou presumidos e à sublimação da homoafetividade. A culpa autoatribuída do abandono das relações primárias e da escolha por experiência diversa da própria individualidade condensa o sofrimento psíquico atravessado na jornada a dois mundos de um jovem cuja adultez fez-se precoce. Neste sentido, conclua-se, o rompimento de sociabilidades interpessoais ao êxodo campo-cidade seria suficientemente estressor, não fosse o acréscimo da desproteção causada à homofobia de origem e ao perigo de existir em outro lugar. Vender o corpo e, por conseguinte, a alma é alegoria interessantemente descritiva da autoexploração ao capital e à economia relacional, ambos meios e fins ambíguos de sobrevivência.

Reelaborada à diáspora, a China original de Yi é escrutinada na ambivalência e na assimetria desveladas ao caminho também dual de Liang Fei na concretização de sua inteireza. Se sobreviver é imperativo, fazer do amor a iguais e interior possibilidade é esperança de longevidade ao refazimento conseguido das histórias coletivas via triunfo da dignidade individual.

Liang Fei (Kai Ko) é um profissional do sexo duplamente rejeitado. Para a família, ainda da indignidade da ocupação laboral, a homossexualidade do rebento é, porque “vergonhosa”, “repreensível”. Foto: reprodução.

Estreia da edição de 2021 do Festival de Cannes (Un Certain Regard), Moneyboys chega nesta quinta-feira, dia 8/2, aos cinemas brasileiros.

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Thainá Campos Seriz
Thainá Campos Seriz

Written by Thainá Campos Seriz

Historiadora (UFF). Pesquisa e revisão de conteúdo no Canal Preto. Escrevo sobre cinema.

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