Felizes Juntos: melancólico, o amor em Wong Kar-wai foge às escolhas e ao tempo
Título original: Chun gwong cha sit; 春光乍洩
País de origem: Kong Kong (1997)
Duração: 96 minutos
Gênero: drama
Direção e roteiro: Wong Kar-wai
História original: Manuel Puig (1973)
Produção: Ye-cheng Chan, Joseph Chi, Jacky Yee Wah Pang, Wong Kar-wai
Fotografia: Christopher Doyle
Montagem: William Chang e Ming Lam Wong
Trilha sonora: Jóhann Jóhannsson
Elenco: Tony Leung Chiu-wai, Leslie Cheung, Chang Chen
Mais perceptível afigura-se o ensaio de compreensão da agência temporal no cinema de Wong Kar-wai em Felizes Juntos (título original: Chun gwong cha sit; 春光乍洩) (Block 2 Distribution, 1997), livremente adaptado da prosa The Buenos Aires Affair (Manuel Puig, 1973). Entre os vários recomeços do romance de Lai Yiu-fai (Tony Leung Chiu-wai) e de Ho Po-wing (Leslie Cheung), a migração à Argentina representa a última tentativa a embalar a permanência lado a lado dos amantes. Neste sentido, a passagem à narração em voice-over já à abertura procura reconstituir a memória do casal ao momento da ida para o país sul-americano, a partir da cronologia dos eventos como recordada ao emissor em uma melancólica rememoração presentificada. Do início em preto e branco alusivo ao drama da sobrevivência em território não natal, o retrato ao tango do período mais emocionalmente conturbado para a dupla tem sua intensidade agudizada sob o desvelar tensionado dos embates por que Fai e Po altercam-se na persecução de expectativas e de interesses distintos.
No querer porquanto atrelado à visita às Cataratas do Iguaçu, a água funda-se visão talvez contraditória ao desejo de constância da relação sexo-afetiva qual escrutinada por um dos parceiros, dado o caráter não obstante sugerido de longevidade entre as eventuais decepções irrompidas. Enquanto a desaceleração realizada onírica no step-printing da análise memorialista de L. Fai esvai-se à implacabilidade de uma Buenos Aires infernal, as grandes angulares efetivam uma sondagem psicológica superintrusiva às personagens em cena, considerando-se a distorção não menos compartilhável das incertezas quanto a uma união futura. Concretizado o retorno sempre ansiado a Hong Kong via Taipei, o desfecho ao som dominante de Happy Together (canção-título do longa em língua inglesa) (Gary Gordon Bonner e Alan Gordon, 1967) na viagem de trem rumo ao destino final aponta uma realidade de desilusão amorosa fadada ao sonho alimentado unilateral de uma vida conjunta, pois idealização romântica.
Em Kar-wai, a certeza do fenecimento das ilusões equipara-se ao peso irrecuperável do tempo às escolhas do passado, e em Chun gwong cha sit, a memória ilustra-se antipedagógica ao esforço uma vez abandonado, mas persistente de realizar perene o amor sentido. Obra-prima!
Visto para o Clube do Filme.