A Memória Infinita: trabalho com a memória política do passado de traumas no presente é ponte para a construção do futuro, provou Augusto Góngora (1952–2023)
Título original: La Memoria Infinita
País de origem: Chile (2023)
Duração: 85 minutos
Gênero: documentário
Direção e roteiro: Maite Alberdi
Produção: Maite Alberdi, Juan de Dios Larraín, Pablo Larraín e Rocio Jadue
Direção de fotografia: Pablo Valdés
Montagem: Carolina Siraqyan
Trilha sonora: Miguel Miranda e José Miguel Tobar
Distribuição (Brasil): Paramount+
Elenco: Augusto Góngora, Paulina Urrutia
Não à toa dedicado a um ensaio visual acerca da função social da memória, A Memória Infinita (título original: La Memoria Infinita, 2023) (Paramount+, 2024) faz um comovente esforço de apropriação da atividade cinematográfica com fim antes memorialístico, eternizando à coletividade o trabalho de uma vida dedicado ao futuro. A imagem desfocada do registro caseiro à abertura do presente longa documental faz a apresentação sobremaneira íntima das biografias de um célebre casal, ao que já aponta como fundamental a parceria amorosa de Augusto Góngora (nascido Augusto José Góngora Labbé, 1952–2023) e Paulina “Pauli” Urrutia (nascida Paulina Marcela Urrutia Fernández, 1969). Neste sentido, a mudança da razão de aspecto a efeitos visuais explicita em flashbacks e no uso de materiais fotográficos ou em vídeo de acervo pessoal a introdução às trajetórias político-profissionais de A. Góngora, proeminente jornalista e apresentador chileno, e de Pauli Urrutia, atriz e ex-Ministra da Cultura do governo Michelle Bachelet (2006–10). Junto à predominância geral de planos abertos, a profundidade de campo ampliada estabelece uma visão onisciente ao cotidiano da dupla, embora aproximado fique o público do início da decadência de Góngora ao Alzheimer. Ao avanço do declínio psíquico, a referência à memória da atuação profissional do biografado torna-se constante, pois certa feita metafórica à tônica de sua existência.
Comprometido com o trabalho da resistência antiditatorial pinochetista (1973–90) e da memória política do período à transição democrática (1991), o ímpeto de reaver ao protagonista a agência sobre a construção do Chile contemporâneo cumpre o papel de conservá-lo à própria identidade ante o fantasma do autoesquecimento. A tarefa histórica com o passado objetiva o desenho de um projeto coletivo de futuro no enfrentamento ao presente, qual eternizado nas linhas da coletânea Chile: La Memoria Prohibida (1989), e como máxima da empresa de memorialização elaborativa e reparadora de traumas pretéritos, o retorno à história individual seria garantia da permanência. Por fim, a montagem opera uma proteção sensível à privacidade de Augusto entre os momentos de crise, a partir do corte a algumas cenas respeitoso, da diminuição do som e do encerramento das personagens em tela aos cantos inferiores de cada quadro, eliminando quaisquer sensacionalismos.
Ao desfecho, porque Augusto G. diz já não ser, a película finda-se, pois à extinção do conhecimento de si, nada ou ninguém mais é. Além-celebrativo de legados, A Memória Infinita faz-se ponte para a longevidade do trabalho com a memória coletiva na produção de presente-futuro diverso.
Indicado ao Oscar 2024 de Melhor Documentário de Longa-metragem, La Memoria Infinita tem direção e roteiro de Maite Alberdi e pode ser visto no streaming (Paramount+).